A mim é viver, amar, conviver, partilhar, dar e receber, criar memórias, ter boas experiências, brincar, ler, escrever, ouvir música, estar em movimento, satisfazer a curiosidade intrépida do conhecimento, brincar… Mas tudo isso implica afetos e libertação de endorfina, serotonina, dopamina e ocitocina, esses fatores que desempenham vários papéis importantes no cérebro e no organismo.
Preciso de sorrir e de rir. Preciso de ficar triste e
chorar. Preciso de deprimir e ressuscitar como a Fénix que idealizamos e
sabemos ser apenas ficcionada.
Preciso de ingerir a vida em golfadas profundas e intensas,
quase texturadas. Podemos tatear a vida, sentir o seu paladar, ingerir os
aromas da vida, visualizar as cores e as nuances que traçam ténues fronteiras
quase indizíveis, ouvir as vozes da natureza e acolher os silêncios do que não
se descortina com nitidez.
Preciso de sentir que o amor que dou, tal como o que recebo,
é gratuito, desinteressado, generoso, altruísta, inteiro, íntegro, autêntico.
Preciso de sentir que sou um ser irracional nos afetos e nas
emoções, entre os intervalos em que a racionalidade exigida pela vida e pelos
desafios do quotidiano se impõe. Mas ser irracional é importante, sobretudo nos
afetos e nas emoções.
O amor é, por definição, irracional. Quando amamos alguém
percebemos que o amor é mesmo irracional e que quanto amamos e nos apegamos a
alguém que faça sentido na nossa vida, tudo o resto faz pouco ou nenhum sentido!
O sentido da vida vem dos afetos, das emoções. Por isso não podemos
racionalizar o amor e os afetos. Damos de nós, porque a dádiva também implica
recebermos satisfação por fazermos a diferença na vida de alguém. O amor não se
cobra, não se pede, não se mendiga. Apenas se sente… ou não será amor!
Porque amamos e sofremos no amor e, ainda assim, insistimos em
resistir persistindo no domínio dos afetos, nós os crentes de que tal
sentimento é irracional? Porque está na nossa natureza. Quem procura escamotear
esta realidade e atribuir critérios de racionalidade aos afetos é porque não
ama de verdade.
Amar é uma não-condição, uma in-condição, porque amar é
incondicional e pode ser incontido, esmagador, tomando posse do nosso ser a
ponto de o tornar vulnerável e precário.
O amor é tudo isso. E pode até ser mais, porque as palavras me
faltam.
O amor é leve e tem peso, é desinteressado e mantém-nos
aprisionados voluntariamente, é dia mas também se sente na noite…
Mas não é eterno. O amor precisa de ser cuidado, estimado,
valorizado, prezado. Quem se esquecer de amar desta forma acaba por perder o
amor que sobre si impendia, depois de perder a capacidade de amar.
Por isso sei hoje que o amor é uma construção permanente,
inacabada, que nos deve desinquietar sempre, de modo a que não percamos a capacidade
de amar e para que não sejamos sujeitos ao vazio que sentimos quando os atos da
outra ou das outras pessoas (amor com pendor sexual, ou amor filial e por
amigos) são vazios de afetos, racionais, racionalizados, ponderados, medidos,
doseados, o que nos empurra para uma espiral negativa de circulo des-virtuoso
que termina na mais pobre miséria do cemitério dos afetos perdidos, alguns irremediável
e eternamente.